quarta-feira, 23 de janeiro de 2008

Impressões sobre direito
de propriedade


Meu nobre Patrício – Somos da mesma terra e não podemos ser de idéias diversas. As tradições de seu nome, as de suas nobres atitudes cívicas, as das relações das nossas famílias, autorizam-me a escrever-lhe. Não seria digno deixá-lo sem a palavra do Rio Grande, sendo como é um dos descendentes da estirpe dos plebiscitários. Aguardemos os fatos para agir. O Rio Grande é um só para o que der e vier. Creia-me e creia que todos nós, nesta hora de angústia nacional, confiamos em quantos têm o nosso sangue e comungam nos ideais superiores da raça gaúcha.
Oswaldo Aranha.

Depois de receber a carta do organizador da nova constituição a ser instaurada pela Revolução de 30, o velho Chico Miranda (foto) produziu uma reflexão impecável a respeito de um dos temas sobre os quais foi convidado a comentar: o direito de propriedade.

Direito de propriedade! É a resposta mais difícil ao questionário, pelas condições baixíssimas de mentalidade atual, sendo, ao contrário, simples e fácil diante da sã razão. A reforma dessa usurpação seria – eliminá-la.

Os bens que a natureza pôs sobre o planeta para a existência e necessidade das espécies, nunca poderiam ser e não são objetos de domínio pessoal. Assim a terra, de que a pseudo-propriedade faz a sua base principal, como a água, como o ar, como a luz, só devem ser considerados o patrimônio eterno da humanidade.

Os próprios bens produzidos ou alcançados pelo trabalho do homem não lhe devem valer senão como posse transitória, como transitória é a sua própria existência. Propriedade, não. Esse monstro filho da força e da depredação e pai de todas as iniqüidades – é preciso matá-lo...


10 comentários:

Prof. Daniel disse...

Mas que tal! Não pude deixar de lembrar uma das tantas falas do Brizola, que emprestava de outros, e as difundia, iluminando seus discurso: "Nós, trabalhistas defendemos a propriedade. Achamos a propriedade uma coisa tão boa, que a queremos para todos."
Um grande abraço, parabéns pelo blog.
Daniel Toscani.

Carlos Eduardo da Maia disse...

Propriedade não é direito absoluto e tem que ter sim uma função social. Mas o direito de propriedade é também fundamental. Nenhuma sociedade se desenvolveu social e economicamente com a extinção do direito de propriedade. Se algum vivente bem vivido souber de algum causo que atire sua funda. A bancarrota da antiga URSS está intimamente ligada a isso. Santa coincidência. Todo mundo queria ser proprietário de alguma coisinha, uma casinha, uma fazendinha, um carrinho e ter acesso ao profano: o fetiche da mercadoria. Mas o Estado Soviético e sua pata de ferro dizia, com sua voz de trovão: Não. Não, nunca, bem capaz, meu rapaz, esse bem é meu, porque ele pertence ao coletivo. E o pobre povo sempre perguntava e não cansava de se indagar: mas quem é esse tal de coletivo que a gente não conhece e nunca viu???

Anônimo disse...

Meu caro Carlos, o pior ou o melhor, depende do prisma, é que o velho Chico, além de estar coberto de razão, era um visionário. Sua visão ultrapassou inclusive o nosso tempo: "É a resposta mais difícil ao questionário, pelas condições baixíssimas de mentalidade atual, sendo, ao contrário, simples e fácil diante da sã razão". Há braços...

Carlos Eduardo da Maia disse...

Prezado Eduardo, estava lendo a carta do Oswaldo Aranha e que mostra como pensava a nossa elite no início do século passado. A carta é típica de um fidalgo: fala em tradição, em estirpe, em raça gaúcha. Ela fala de um tempo que passou, porque definitivamente a estirpe, a raça, ser filho de alguém ou de certas famílias não significa - hoje - o que significava antigamente. Isso mostra que o Brasil está mudando e para melhor. Existem braços.

Anônimo disse...

Propriedade atende a minorias privilegiadas que as mantém graças ao trabalho das maiorias. O trabalho aliena exatamente porque seu resultado é carreado para uma minoria. Hoje se sofisticou, pois algumas nações viraram corporações transnacionais a serviço da uma minoria de "negociantes" e, não por acaso, proprietários.

armando

Carlos Eduardo da Maia disse...

Armando, existe alguma sociedade que aboliu o direito de propriedade e deu certo? Havana é uma cidade pitoresca e muito bonita, mas as casas estão em ruinas, falta pintura, falta reforma, falta tudo. E por que falta? O mesmo acontecia em Berlim Oriental. Coincidência?

Anônimo disse...

Maia, deixe Cuba em paz, ou como dizem os cubanos, tire seus olhos de cobiça daqui. A propriedade é algo muito recente em termos históricos. Várias sociedades viveram sem a propriedade jurídica que os neoliberais defendem, explorando, no bom sentido, os recursos e devolvendo as terras, rios, e tudo que existe sobre o solo às gerações futuras. Assim, viveram os Guaranis, e todas as demais tribos nas Américas. Assim viveram os paraguaios até que o Brasil os destruiu. Assim, vivem os judeus nos Kibutz. E comunidades, muitas, no próprio EUA.

armando

Anônimo disse...

Evidentemente, refiro-ma à propriedade definida pelo Código Civil, patrimonialista por excelência.
armando

Prof. Daniel disse...

Complementando o que Armando diz sobre Cuba: Se falta pintura e outras coisas nas casas em Cuba, muito mais se deve ao Bloqueio imposto ao país, do que por inépcia do sistema de governo... Isto se observa, não é necessário copiar de ninguém para fingir que sabe... Comparar Berlim Oriental é, no mínimo, desonesto neste caso. Cuba venceu o tigre, esse é seu grande feito. E se mantém, graças a um povo heróico, a poucas milhas do algoz das américas, sendo um exemplo de que o imperialismo imposto, e tão aclamado por embasbacados serviçais daquela pseudo-democracia, pode ser derrotado a qualquer momento.
Antes de criticar a "ditadura" de Fidel, de denominá-lo ditador, ele que só chegou ao poder porque o povo assim o quis, lembre-se que teu discurso é o mesmo daqueles que chamaram (e ainda chamam), Pinochet e Médici de presidentes.

Anônimo disse...

Não podemos esquecer que Luiz Carlos Prestes foi convidado por Getúlio Vargas para ser o chefe militar, se não me engano, da Revolução de 30. Não aceitou por achar que ela significava apenas uma troca de oligarquias no poder. Portanto, o perfil daquela geração era reformista. Por outro lado, somos hoje o resultado do conjunto das opções políticas de nossos antepassados. É claro que preferia uma Revolução de 30 com a visão de Francisco Miranda e a presença de Prestes no comando militar. Acho que nossas passagens pela sala de visitas da nossa história deve nos levar a refletir sobre isso. E se o Cavaleiro da Esperança tivesse assumido o posto, com a gloriosa Coluna ainda "quentinha", apenas para garantir determinados avanços com sua habilidade e sabedoria e ver o que poderia ser feito? Outra coisa, temos que levar em consideração que Getúlio foi criado numa "famiglia" cujo braço armado até os dentes era o Beijo Vargas e o "capo" era o pai. Acredito que os acertos de Getúlio foram inspirados pelas idéias dos plebiscitários e os erros foram resultado da influência familiar, embora nenhum historiador faça essa obesrvação. Por que? Como dizia José Marti: "conhecer é resolver". Acho que não basta apenas conhecer, é preciso projetar outros cenários para extrair do conhecimento as soluções. Sinto falta, nas análises de conjuntura que são feitas na blogosfera com extrema competência, das outras formas de luta constante (como o MST) excetuando a democracia formal.